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23 de julho de 2014

Metamorphosis


Um homem brasileiro decidiu que, já que era feio, não perderia nada em transformar-se no diabo. E foi o que fez. Injectou dois cornos, tatuou-se, esburacou a pele com alargadores, piercings e afins. Wonder why.
No Japão, tentemos ser compreensivos para esta exótica cultura, há uns tempos foi moda injectar a pele com silicone, para formar altinhos estranhos na superfície, como bolas, donuts, cornos, etc.. WHYYY???
Em Portugal, euzinha decidiu submeter-se a algumas sessões de acunpu-masoquismo e auto-mutilação para que o ego ficasse inchado por ter um par de tatuagens, uns piercings e uns alargadores.

E a pergunta: o que passa exactamente pela cabeça das pessoas quando se submetem a certos métodos dolorosos para alcançar um nível de beleza supostamente superior? E sem falar deste tipos de acessórios! Vamos lá mencionar apenas os mais óbvios: botox, depilação, arrancar de cutículas, dietas extravagantes que exigem fome... A beleza tem de doer assim tanto? Não podemos apenas ser Adões e Evas com pelinhos nas axilas, cabelos despenteados e cara lavada?
Agora, falando em acessórios. As minhas crenças, no fundo, também são tão fúteis como o cerne da minha crítica, mas bom argumento fundamenta e justifica a futilidade. Eis então os motivos pelos quais sou meio masoquista: começando, como é lógico, pelas tendências, eu tinha cerca de 14 anos quando decidi que queria ser uma chinesa ruiva-laranja, de piercing na cartilagem direita e com uma tatuagem. Lá fui pintar o cabelo, lá fui furar a orelha, mas deixei a tatuagem para mais tarde, pois ainda dependia financeiramente dos progenitores. Se fui mais feliz? Não sei, julgo que sim. Já alimentava a ideia da mudança, e acredito piamente de que o exterior auxilia na mudança interior. Como o feng shui na decoração, como o ambiente social em que vivemos: são elementos exteriores e físicos que nos influenciam inconscientemente, adaptamo-nos e aprendemos a gostar deles. Um brasileiro não nasceu com características do seu povo acolhedor e caloroso, mas adquiriu-as durante o seu desenvolvimento. Se este brasileiro emigrasse para o Japão, ainda jovem, provavelmente regressaria à terra natal com silicone injectado na testa em forma de donut. Eu estou a falar a sério:
Bagel Head -.-
Ah! E sei outra: Por a extrema beleza ser considerada uma perfeição pouco natural, para se tornarem mais imperfeitas, mais ainda assim apetecíveis, as japonesas submeteram-se a um aparelho dentário que em vez de endireitar os dentes, entorta-os. Sinceramente...
Continuando. Lá a mudança se efectuou, mas o ego não ficou saciado e aos 17 fiz a minha primeira tattoo. Prometi que seria a primeira e a única, uma vez que na altura ainda disponha daqueles valores morais de colocar o trabalho em primeiro lugar, e secretamente ambicionava em ser hospedeira de bordo (HAHAHAHA), um trabalho para o qual é rigoroso ter uma pele livre de acessórios deste cariz (HAHAHAHAHAHA) Ok. Lá se foram os valores de gaja decente. Cheguei nesse mesmo ano colocar um alargador, só que comecei a trabalhar, e como ainda persistiam os bons valores da moral e da decência, tive o bom senso de o retirar. Aos 18, fiz a segunda tatuagem e planeei fazer uma terceira, a cores. Os alargadores voltaram, a mãe ameaça desmaiar cada vez que dá uma olhadela à orelha e aqui estou eu a redigir um texto sobre acessórios na minha procura pela identidade. Oh, so deep.
Pois é, é isso. Se antes as tatuagens eram para yankees e piratas, a delinquência do agora informa-se acerca dos preços da tatuagem, se o material é limpo, se há risco de contrair SIDA, se a tinta permanente vai ficar num sítio que daqui a uns anos vai murchar quando formos velhos alimentados a Viagra e velhas com maminhas decadentes. Os jovens que furavam a língua na casa de banho da casa, passaram a furar nas lojas autorizadas por organizações de saúde pública e depois de a furarem, dirigem-se para o dispositivo fotográfico mais próximo para poderem tirar uma #selfie, e colocar no #facebook ou em outras redes sociais que permitem hashtags. Os acessórios deixaram de servir para chocar as mentes tradicionais, agora só têm como utilidade enfeitar, e no máximo, impressionar impressionáveis.
Além das irresistíveis tendências do nosso amado século vinte e um, a juventude começou a achar essencial perfurar a pele com utensílios afiados, mas esterilizados, para marcar a sua identidade. E aqui está o meu segundo motivo. Como referi, aos 14, numa tentativa de sair da antiga personalidade, comecei a fazer como as cascáveis: arrancar a pele envelhecida. Portanto, recorri à metamorfose que tanto deixa a mãe desgostosa. E entra aqui a teoria da identidade. Ponto um, nós somos o que queremos, mas também somos aquilo que os outros nos rotulam. Não existe um meio termo. Ou seja, a forma como nos manifestamos, mesmo que contrárias às nossas crenças vai ser aquilo que nos define. No ensino secundário, se recusas a primeira saída nocturna, não surgirão mais convites. Se tiras a nota máxima, meu amigo, prepara-te para o plágio da carteira ao lado. Então, não é apenas querer. Para o ser, tens de agir como tal. E a maneira mais fácil começa por definir os valores, os interesses. Depois passa por adequar o círculo de amizades e o visual a tal. Organizar a mente, tomar um rumo e decorar o ambiente para que se adeque ao nosso mantra. Ao espalhar o lema, o efeito ricochete é que as pessoas ao redor irão nos tratar tal como nos mostrámos, ou seja tal como sempre quisemos. Mesmo que isso vá contra as tendências atuais. Por exemplo, se eu, cá em Portugal, começar a achar graça aos donuts na cabeça, o primeiro passo a tomar é aceitar que quero o raio do donut enfiado na testa. Se nem eu aceitar, os comentários depreciativos (de pessoas que obviamente não acham atraente a ideia de ter um donut na testa - oh va lá, uns cornos ainda vá que não vá, um donut???) irão criar complexos e vacilos. E aí surgem as crises existenciais. Oh, quem sou eu? Ser ou não ser, eis a questão!
Tudo isto, apenas para justificar a minha auto-criticada ridícularidade em querer fazer estas coisas estranhas ao corpo. A sério, tenho orelhas tão wiiNdAz, com uns lóbulos a ameaçar tornarem-se o próximo sex symbol cosmopolitano, por que raio é que decidi alargá-lo com dois buracos fedorentos?! Modas, vá se lá saber. Portanto é isto. Façam os disparates corporais que quiserem. Desde que o saibam justificar.


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